o azul como cor que marca experiências afro-diaspóricas e me encontrei debulhando flores para pintar com pétalas azuis, as quais jamais serão fixadas no tempo: a Flor Clitoria Ternátea, que sopradasobre
papel aguado, me ensina caminhos de formas azuis cada vez mais disformes, difíceis de nomear e, por isso, às vezes não é possível de retê-las no tempo.
(Trecho da tese de doutorado de Juliana dos Santos)
Como reunir os critérios que “definem” uma cor?
Pode-se dizer que desde Aristóteles para compreender as coisas do mundo a via da ontologia tornou-se uma das principais buscas do pensamento ocidental. Para essa conduta, tudo poderia ser definido pela ordem do ser; e dentre todas essas coisas, estão as cores.
O azul é a cor que Juliana dos Santos tem se dedicado a compreender. Nesta tarefa, a artista não tem, entretanto, se fechado à busca por uma delimitação exata, Dos Santos orienta sua apreensão e interpretação do mundo pela via dos saberes afro-diaspóricos e na valorização dos encontros. É nesse sentido que a elaboração de suas pinturas com a flor clitoria ternatea se dá por meio de um olho-corpo que se completa com a memória dos cantos agudíssimos em uníssono das festas dos Rosários dos Homens Pretos, das capas esvoaçantes do rei e da rainha do congado e do ritmado dos gungas do moçambique. É um azul que herda o desejo de sonoridade, de uma música profundamente azul, como quando ouvimos Azure, de Duke Ellington.
Há uma forma confluente de existir que estabelece uma relação complexa e aberta. O azul da clitoria ternatea passa a ser também a ocupação de espaços, as danças e os sons em movimento, e o tempo em sua duração, que pode ser visto, por exemplo, no processo de oxidação da flor.
É por meio das aberturas às possibilidades de existências que Dos Santos toma o azul como conceito expandido que se instaura no campo social, político, imagético, textual, cinematográfico e sonoro. Esta exposição coincide com a finalização de sua tese de doutorado, ambas dedicadas à sua pesquisa de pintura com a flor.
A instalação apresenta as pinturas em grande formato que se expandem por todo o espaço. Ao nos envolver, Dos Santos consegue nos colocar em um corpo a corpo com a cor, com a explosão das texturas, com os movimentos que desenham ritmos e gestos, com a delicadeza dos tons violáceos da clitoria ternatea. Sua intenção é de nos fazer aquietar para que consigamos nesse tempo da cor ouvir os murmúrios de um azul profundo.
Khadyg Fares